A ARTE DE EDUCAR BEM

Resumo:A partir de um caso imaginário, o Prof. Luiz Eduardo tenta apresentar uma situação referente aos principais problemas educacionais encontrados na sociedade, indicando como sendo possíveis culpados a família e o governo e ainda propondo uma conscientização das escolas para o orientação de que a coletividade deve ter prioridade sobre a individualidade como regra na sociedade.


A ARTE DE EDUCAR BEM

 

“Educação é fundamental”. “Sem educação não há solução”. “A educação é a base de tudo”. “Todos os problemas são, antes de tudo, problemas de educação”. Esses e vários outros chavões já foram ouvidos milhares de vezes por quase todas as pessoas, mas como são chavões não parecem ser verdades e as pessoas escutam e repetem, porém não acreditam, não investem e não vivem as verdades contidas em cada um desses chavões.

A confirmação destes fatos traz em si a própria necessidade da educação e a consequente carência educacional em que vivemos, pois não efetivamos os conceitos educacionais que proclamamos. Isto é, vulgarizamos a educação de forma tal que a própria noção que temos de educação é de algo que não tem muito valor, embora tenhamos que adquiri-la por conta de alguma convenção pre-estabelecida, algum mal sociológico ou talvez até, porque possa ser interessante ser educado.

A educação passou a ser, por contingência, o assunto da moda, que sempre está fora da moda. Falamos em educação todo o tempo, porém não fazemos educação em momento nenhum e o que é pior, deturpamos a noção de educação e criamos um cenário em que não ser educado acaba sendo uma grande virtude, pois estimulamos atitudes que refletem grande falta de educação.

Em suma temos uma situação conflitante entre a teoria e a prática, no que tange a educação. E esse quadro precisa ser modificado vertiginosamente, pois os abusos advindos desta confusão epistemológica, metodológica e conceitual têm produzido uma total inversão de valores na sociedade em todos os níveis. Sendo assim, vamos tentar demonstrar como imaginamos que será possível produzir uma boa educação.

Imaginemos a seguinte situação teórica.

Uma senhora com toda a preocupação possível vai atravessando a rua e eis que um menino de bicicleta, em alta velocidade e na contra mão, atropela a senhora, derrubando-a no chão, e vai embora, sem que ninguém se manifeste e ainda diz assim: “o velha cega olhe por anda, quase que me você derruba, sua nojenta”.

Na verdade, nos tempos atuais a falta de educação e a libertinagem é tal, que a terminologia utilizada certamente seria de mais baixo calão do este. Mas, isso não vem ao caso, até porque é só um exemplo.

Quero crer que qualquer pessoa já deva ter visto (talvez até vivido) uma situação parecida com esta.

Agora vamos tentar descobrir e analisar quantos problemas educacionais existem na cena:

1 – Menino de bicicleta na contra mão – O “Novo” Código Nacional de Trânsito, que lamentavelmente, não pegou, proíbe que ciclistas trafeguem na contra mão. Lei é lei e não tem que pegar ou não, ela tem que ser cumprida ou então não é Lei.

2 – Agressão física à Senhora – Derrubar uma senhora, de propósito ou não, é uma agressão física, que pode refletir, pelo menos falta de atenção, entretanto muitas vezes esse atropelamento é premeditado (desculpem-me pelo pré-julgamento).

3 – Ofensa moral à Senhora – Ofender, sem razão, com palavras de baixo calão uma Senhora é, no mínimo, uma falta de princípios éticos e de consideração com as demais pessoas da sociedade.

4 – Falta de respeito ao falar com uma pessoa, particularmente sendo mais velha – Desrespeitar uma pessoa mais velha demonstra total falta de escrúpulos e de noção de moralidade e da valorização que os mais velhos devem ter, pois precedem a nossa existência. Se eles não tivessem vivido, talvez também não vivêssemos.

5 – Segundo o ciclista, a senhora é quem quase derruba ele – O egoísmo e o individualismo são duas das principais características dos mal educados. Parece que só eles existem, pois só eles são importantes. As outras pessoas sempre os atrapalham, mesmo quando são eles quem protagonizam as ações drásticas.

6 – Total despreocupação com as pessoas do entorno – No momento da ofensa, o mal educado diz qualquer coisa para qualquer um, sem se preocupar com quem está por perto. Até porque, como foi dito no item anterior, as outras pessoas não são importantes.

7 – Alienação das pessoas do entorno, que não fizeram nada – A sociedade é hipócrita, apática e não reage às ações que ela efetivamente reconhece como sendo errôneas. Aceitamos tudo, desde que não sejamos envolvidos direta ou indiretamente.

8 – Essa cena acontece, várias vezes, todos os dias – A sociedade já se “acostumou” com as coisas erradas como estão e certas situações tornaram-se banalizadas a ponto de não fazerem nenhuma diferença no comportamento social.

Então eu pergunto: o que a sociedade tem feito para evitar isso? Eu mesmo respondo. Nada, absolutamente, nada.

Não fazemos nada porque todos somos mal educados e porque estamos bem com a nossa má educação. Só procuraríamos entender e talvez até discutir o problema se, por acaso, estivéssemos no lugar da senhora. Aí, ficaríamos aborrecidos e iríamos procurar aqui e ali uma maneira de culpar alguém do acontecido.

O mais interessante é que ainda assim, muitos de nós relutaríamos em culpar o menino, porque há um outro aspecto a ser considerado. A sociedade tem medo e nós não sabíamos quem era aquele menino, que passou tão rápido e não foi possível identificar. De repente, ele era filho de alguém importante, ou era filho de um parente ou amigo nosso, ou ainda poderia ser um aprendiz de marginal (“trombadinha”), que na verdade queria pegar a bolsa da senhora. Então, porque dizer alguma coisa e correr um risco desnecessário. Diz o ditado que: “em boca fechada não entra mosca” e que “quem não faz nada não vai preso”. Por outro lado, eu quero lembrar também que “quem não deve, não teme” e que “aquilo que eu não quero para mim, não devo fazer aos outros”. Aliás, esse último dito deveria ser o grande acordo de toda sociedade para poder viver bem.

Geralmente, o principal culpado que encontramos é o Governo, em qualquer dos seus níveis. Efetivamente o Governo tem a sua parcela de culpa, mas não é, de forma nenhuma o único culpado. A culpa é da sociedade mal educada que somos. Nossa sociedade, ao invés de tentar deter ou, pelo menos, remediar a tempestade, faz que nem avestruz, enfia a cabeça no buraco para não ver o que está acontecendo e espera a tempestade passar. Como não vimos o que aconteceu, pois estávamos com a cabeça enterrada, não podemos fazer nada em relação ao assunto. Assim, a cena se repete várias vezes e ninguém vê e muito menos diz alguma coisa.

O título desse artigo fala na arte de educar para o bem e a mim parece extremamente fácil. Basta começar a agir no sentido contrário da maré e ao invés de concordar com os erros, ou fingir não vê-los, ou ainda culpar o Governo por todas as coisas que acontecem, porque não começar um processo de depuração da sociedade pela sociedade. As coisas erradas (ruins para a coletividade) devem ser reprimidas pela sociedade, pois só assim elas tenderão ao desaparecimento.

Educar para o bem não é fazer só coisas boas ou benevolentes, mas é, antes de tudo, trabalhar pelo interesse coletivo e contra o individualismo. A sociedade é muito diversa pois é composta de vários setores, vários segmentos, vários profissionais que se unem e que se corporativizam em vários grupos, entretanto todos esses grupos são formados, sobretudo, por pessoas. O interesse das pessoas tem que estar acima do interesse dos grupos, pois esses últimos só existem porque as pessoas existem.

É preciso educar para o bem, fazendo o bem social e rechaçando o mal à sociedade. A família precisa se reestruturar e o Governo precisa fazer a sua parte, mas é preponderante que a sociedade diga o que quer e prove que quer o que diz querer. A ação social coletiva vai acabar com o menino na contramão em alta velocidade, porque não haverá interesse social que conceba este fato. A senhora vai poder atravessar a rua e talvez até ela seja atropelada, mas a postura do menino e das pessoas do entorno serão outras, basta apenas a sociedade querer.

As escolas deverão ensinar esse preceito, a vida em sociedade tem que ser boa para todos e “o direito de cada um acaba, quando começa o do outro”. Andar de bicicleta é um direito, mas andar a pé também é. As pessoas só andam de bicicleta porque primeiramente foram capazes de andar a pé, então andar a pé tem prioridade sobre andar de bicicleta. O menino precisa aprender isso e tem que entender que há uma Lei, o Código Nacional de Trânsito, que dispõe sobre a maneira correta de proceder quando se está dirigindo um veículo, seja um caminhão ou uma bicicleta. Mas ele terá que se conscientizar de que antes da bicicleta ou do caminhão estão as pessoas e que ele também é uma pessoa que tem direitos e deveres para com o resto da sociedade.

Será que isso é tão difícil assim? Será que acreditar que é possível educar para o bem é uma utopia? Será que todos males que afligem a sociedade não resultam desta falta de educação par o bem? Desta falta de vontade coletiva de viver melhor?

A educação é um processo e como tal só se desenvolve com trabalho e metodologia adequadas. A arte de educar bem deve ocorre a partir de princípios éticos que destinem a sociedade ao bem, isto é, princípios que evidenciem a importância e a necessidade do coletivo antes do individual. Arregacemos as mangas e vamos colocar as mãos na massa para construirmos uma nova sociedade, que se não beneficiar a todos, certamente beneficiará a grande maioria e que acabará com a nossa falta generalizada de educação.

Luiz Eduardo Corrêa Lima

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