Políticas Públicas Municipais para o Meio Ambiente
Resumo: Nesse artigo, que foi escrito para provocar uma discussão durante a Mesa Redonda sobre Políticas Públicas Ambientais Municipais, promovida pelo Centro Universitário Teresa D´Ávila – UNIFATEA, são apresentados vários exemplos, que demonstram como o cidadão e grande parte dos administradores são enganados, pela mídia, quanto às questões ambientais. Também fica claro que há muitos administradores que se aproveitam desse “status quo” e deixam de lado às políticas públicas ambientais.
Senhoras e senhores, exatamente em setembro de 2008, publiquei no portal do Recanto das Letras e na Revista Eletrônica Veja São José um artigo intitulado “As Políticas Públicas para o Meio Ambiente”, artigo que continua na INTERNET para quem quiser ler, já foi lido até aqui, cerca de 11 mil vezes no portal do Recanto das Letras e outras quase 5 mil vezes na Revista Veja São José, que foi extinta, em 2014. Além disso, ele certamente foi lido outras tantas mil vezes, considerando outras publicações, que o republicaram, e ainda a distribuição de centenas de cópias impressas que muitas pessoas pediram e eu autorizei.
Sou suspeito, mas penso que o artigo é realmente muito bom. Inclusive fui homenageado num evento aqui na Câmara Municipal de Lorena, em 2011, num debate sobre o tema Políticas Públicas para o Meio Ambiente, onde o citado artigo foi lido e assumido como documento base para o estabelecimento das discussões que nortearam o evento. Bem, imagino que o artigo tenha sido lido, até aqui, pelo menos 30 mil vezes, entretanto creio que poucos administradores públicos tenham lido, além dos de Lorena daquela época, a quem aproveito para agradecer a homenagem.
Confesso que depois de 11 anos passados, duas eleições municipais transcorridas e mais uma chegando, acredito que nesse período quase nada mudou, porque os administradores públicos continuam não dando muita trela para a questão ambiental. Mas, a questão que fica é, por que isso acontece? Por que os administradores públicos de maneira geral e salvo raras exceções, aparentemente não estão nem aí com os problemas ambientais?
Bem, considerando o que acontece em outras áreas, acredito que o setor de Meio Ambiente deveria decidir sobre os interesses relacionados ao Meio Ambiente, entretanto não é exatamente isso que tem sido visto em nenhuma das esferas de governo. Lamentavelmente o meio ambiente tem sobrevivido administrativamente a reboque de outras áreas. Isto é, áreas onde os setores efetivos e reais do meio ambiente têm abrangência, mas que, na verdade, são obrigados a negociar com outros interesses dessas áreas, por exemplo, saúde, agricultura, planejamento, transporte, educação e outras.
É óbvio que dessa maneira torna-se muito difícil que sejam definidas políticas públicas ambientais efetivas, principalmente na esfera municipal, onde, além de tudo, existe uma carência generalizada de recursos públicos, tanto financeiros, quanto humanos. No caso específico dos municípios da região do Vale do Paraíba a situação se agrava ainda mais, por conta de outros interesses locais ou mesmo externos à região serem considerados mais importantes. Logicamente isso não deveria acontecer dessa maneira, até porque o Artigo 30 da Constituição da República Federativa do Brasil garante ao município o direito de legislar nos assuntos de interesse local, mas questões ambientais aparentemente não costumam ser do interesse local para a maioria dos municípios.
Por outro lado, é fundamental que se diga, que o município é, de fato, o único espaço físico que realmente existe, pois tudo acontece, em última análise, no espaço físico do município. O saudoso Governador André Franco Montoro já dizia: “nada acontece na União ou no Estado, tudo acontece no município”. E certamente o Montoro tem razão na sua fala. Por uma questão aparentemente fortuita, a grande maioria dos administradores e governantes municipais ainda não se aperceberam dessa realidade e assim, muitos desses administradores insistem em se submeter, principalmente na área ambiental, aos interesses e muitas vezes aos desmandos da União ou do Estado.
O Município de Lorena tem sido uma das raras exceções a essa questão, pois o trabalho do Secretário Willinilton Portugal, dentro de suas limitações, tem sido bastante profícuo e merece ser destacado. O nosso ex-aluno Luiz Marcelo Marcondes, em sua passagem pela Diretoria de Meio Ambiente da Prefeitura de Aparecida, também fez um bom trabalho. Quer dizer, temos aqui duas exceções, porque essa não a regra para a grande maioria dos municípios da região. Muitos dos municípios, lamentavelmente, ainda nem possuem setores específicos para tratar o Meio Ambiente em suas estruturas organizacionais. Sendo assim, a grande maioria dos municípios do Vale do Paraíba ainda tem questões ambientais sendo tratadas por outros setores, pois, como já foi dito, “não existem recursos financeiros e nem pessoal técnico na área”. Em suma, o meio ambiente é relegado a segundo e terceiro planos no interesse político municipal, ou simplesmente é deixado de lado e esquecido. Há de se convir que desse modo é quase impossível que sejam estabelecidas políticas públicas municipais de meio ambiente.
Na maioria das vezes, no que se refere ao meio ambiente, literalmente, os administradores municipais tentam “apagar os incêndios, quando eles surgem” ou, quando muito, apenas seguem os procedimentos genéricos definidos pela Legislação Federal ou Estadual, para dizer que estão cumprindo a lei. Mas, mesmo assim, essa segunda hipótese geralmente só ocorre, quando essa condição, de alguma maneira é conveniente a outros interesses que a justifiquem, porque o, já citado, artigo 30 da Constituição Federal propicia esse direito ao município. Isto é, quando interessa ao município o artigo 30 é praticado, pois no interesse público local o município pode legislar e geralmente estabelece uma lei municipal que resolve a situação omitindo o problema ou arrumando outro maior.
Quer dizer, em termos de políticas públicas ambientais, os municípios ficam semelhantes aos “cachorros correndo atrás dos respectivos rabos” e quase nada se resolve ambientalmente. Por sorte, de vez em quando acontece uma catástrofe ou um evento anormal e algo precisa ser providenciado de maneira mais efetiva. Mas, aí já foram vidas perdidas e ambientes destruídos. A nova preocupação só vai surgir, quando nova catástrofe acontecer, por isso algumas pessoas até torcem para que as catástrofes aconteçam mais regularmente. Enfim, enquanto a coisa seguir assim, com esse descomprometimento generalizado da maioria dos administradores públicos e da falta de cobrança efetiva e contundente das comunidades pela solução dos problemas ambientais, dificilmente haverá o estabelecimento das políticas públicas ambientais que se fazem necessárias.
Por outro lado, existem alguns municípios que têm áreas protegidas por Unidades de Conservação ou por outros aspectos particulares (represas, usinas, quarteis, margens de rodovias e ferrovias, áreas de segurança e outras) e por isso acabam sendo mais bem cuidados. Mas, é bom lembrar que isso também é resultado das legislações específicas federais e estaduais que existem para cada caso desses e obviamente a União e o Estado fiscalizam melhor aquilo que lhes interessa. Entretanto, mesmo assim, tudo costuma ser muito superficial ou extremamente específico aos interesses próximos e às necessidades intrínsecas dos administradores. Os possíveis relacionamentos e as questões próximas servem apenas como válvulas de escape e não importam muito. Aliás, essa é uma prática bastante comum aos interesses administrativos, muda-se o foco central para minimizar os danos, tentado demonstrar que o problema real não ocorre efetivamente.
A máxima ambientalista que diz: “pensar globalmente e agir localmente”, costuma ser esquecida, mascarada e até mesmo invertida, pois as pessoas são levadas a pensar e agir sobre realidades distantes com as quais elas não têm nenhuma relação ou qualquer poder para tentar atuar. O foco muda e são transferidos os problemas, como se eles não acontecessem exatamente naquele local. A barulheira que se está fazendo sobre as queimadas na Amazônia é um bom exemplo desse fato. É claro que os incêndios na Amazônia são problemas ambientais gravíssimos e precisam ser impedidos, combatidos e os causadores têm que ser presos, entretanto eles sempre aconteceram e em algumas épocas em níveis mais violentos que os atuais e nunca houve nada parecido com essa barulheira que está aí. Na verdade, a questão não são os incêndios, eles apenas estão servindo ao propósito de alguém e a mídia safada se aproveita disso. Mas, vamos deixar isso de lado e voltar ao nosso tema.
Hoje temos muitos outros problemas mais graves, mais prementes, mais próximos de nós e talvez até mais fáceis de serem resolvidos. Mas, desses problemas, muitas vezes, nós nem ficamos sabendo, porque a mídia não nos informa, pois não há interesse da mídia e também porque ninguém sabe que esses são problemas ambientais, haja vista que não existem políticas públicas preocupadas com essas questões e elas passam despercebidas como problemas pequenos e muitas vezes nem são consideradas problemas, quanto mais relacionadas ao meio ambiente. É tudo muito bem feito e se não há alarde de ninguém e nem denúncia, obviamente não há crime e assim a mídia continua informando o que não interessa e caravana passa como se não existissem problemas locais.
Meus amigos, nós estamos andando na contramão dos interesses públicos ambientais e criando, cada vez mais, problemas a qualidade de vida das pessoas e ao meio ambiente, com a conivência de administradores públicos, da mídia e principalmente da falta de participação comunitária, de exercício pleno de cidadania das populações que, na maioria das vezes, prefere não se envolver. Temos que acabar com o “jeitinho brasileiro” e a permissibilidade nesse país, porque isso não nos permite conhecer as coisas e obras absurdas e ambientalmente incorretas que acontecem na frente dos nossos narizes. É incrível, mas muitos de nós realmente não vemos e outros, que não querem mesmo ver, fazem tudo para que continuemos não vendo, a fim de as coisas continuem assim. Além disso, a vida, o meio ambiente e o planeta que se danem, desde alguém possa ganhar alguma coisa.
Vou dar alguns exemplos de algumas dessas coisas absurdas que aconteceram na região para reforçar um pouco a memória dos senhores: desmatamentos em Unidades de Conservação à revelia da lei e com justificativas infundadas, construção de teleférico sobre autoestrada, supermercado e loteamentos em Áreas de Preservação Permanente, degradação de centenas de hectares de terra para construção de aeroporto sem nenhuma autorização, tentativas de implantação de Usinas Termelétricas para favorecer multinacionais, autorização de construção de Pequenas Centrais Hidrelétricas em áreas indevidas e contra a vontade do Comitê da Bacia Hidrográfica, criação de centros religiosos sem nenhum critério ambiental e secando nascentes, implantação de “Shoppings Centers” sem estrutura viária compatível, construção de estradas e represas sem autorização, impermeabilização do solo, mineração de areia em área proibida e indevida, poluição atmosférica e hídrica visível sem nenhum constrangimento, transposição de água por decreto e vai por aí afora.
Mesmo municípios velhos, grandes e potencialmente ricos não fazem o dever de casa direito. Projetos e programas ambientais comprovadamente bem planejados, interessantes, benéficos e até premiados internacionalmente são destituídos e extintos por outros interesses menores. Por exemplo, o Projeto Sementes do Amanhã e a Casa Ambiente de Guaratinguetá, a liberação das margens dos rios para a exploração de areia sem critério em vários municípios, o desrespeito às áreas protegidas e seus respectivos entornos, até mesmo por parte dos administradores públicos. Administradores públicos que burlam, esquecem ou mudam leis para valorizar suas áreas e outros criam zonas especiais em seus municípios sem nenhum critério técnico. Emancipação e criação de novos municípios, a despeito da real capacidade econômica, sem nenhuma coerência lógica e principalmente sem nenhuma análise técnica que justifique o ato.
Meus amigos, nós brasileiros, somos campeões mundiais em desatenção ao interesse coletivo e desfaçatez. Somos os verdadeiros “caras de pau” e só olhamos para o nosso umbigo. Assim, como poderemos fazer políticas públicas ambientais municipais de qualidade?
Lamentavelmente estou cada vez mais cético quanto a qualidade e a competência da maioria dos nossos administradores e acho que enquanto nós não votarmos em administradores públicos com visão regional, preocupados com o meio ambiente e comprometidos com o devido interesse em proteger a coletividade na ocupação do espaço físico dos municípios, dificilmente teremos melhoras no quadro. Aliás, penso que a coisa tende a piorar e só a população entendendo que os problemas locais são mais importantes, participando do processo e cobrando as ações devidas poderá mudar essa situação calamitosa e cujas perspectivas em alguns municípios, pelo que temos visto, infelizmente, são as piores possíveis.
Luiz Eduardo Corrêa Lima
15/09/2019
Prezado Doutor Luiz Eduardo, um assunto complexo quando nos deparamos com legislações em todas as esferas (Federal, Estadual e Municipal) como exemplo a mudança do Código Florestal, a questão das demarcações das áreas de segurança de Unidades de Conservação, a questão da viabilidade sócio-econômica de empreendimentos potencialmente poluidores e degradadores, desapropriação de terras e Planos Diretores que beneficiam o desmatamento pois as zonas de proteção são alteradas a cada 10 anos quando tem-se um poder executivo e vereadores egoístas que desejam lucrar com loteamentos… Uma realidade que depende dos eleitores serem informados tecnicamente para poderem compreender o quanto uma lei permite a destruição ambiental. Agregado a tudo temos a falta de corpo técnico nas poucas secretarias municipais … Há também relatos porém não sei a veracidade do fato que a Cetesb não possui corpo técnico para avaliar um documento técnico de levantamento de fauna para licenciamento ambiental de qualquer empreendimento independente do nível de poluição ou degradação que irá gerar durante ou após a construção. Faz-se necessário termos em todas as esferas pessoas capacitadas e com idoneidade para iniciar as mudanças necessárias e urgentes.
27/09/2019
Meu caro Zimmermann, primeiramente peço que me desculpe pela demora na resposta, mas tive alguns problemas de acesso ao site e dependi de meu filho para acertar as coisas. Agora que já está tudo bem, estou respondendo.
Primeiramente obrigado pelo comentário, mas eu quero dizer que concordo com quase tudo que você disse, menos com o fato da CETESB não possuir corpo técnico específico para algumas áreas. Ora a CETESB está entre as 5 principais agencias ambientais do mundo e se há falha em algum setor é por culpa da própria CETESB ou do Governo do Estado que responde por ela. Entretanto, eu penso que a questão não é exatamente essa, o que acontece é que nós estamos no Brasil e por isso mesmo, ainda estamos sujeitos a muitas coisas “inexplicáveis”, principalmente no que se refere a fiscalização feita pelos órgãos públicos. Agora mesmo, como Conselheiro do Conselho estadual de Meio Ambiente, fiz um ofício para a CETESB, por conta de uma denúncia que recebi, em relação a uma fábrica em Guaratinguetá. Tenho vários relatos de moradores que afirmam o problema, mas a CETESB me informou que não há nada e que está tudo dentro da normalidade. Quer dizer, a questão vai ter que ser judicializada, porque tem alguém mentindo.
Esse é o grande problema no Brasil. As pessoas defendem absurdos e os políticos sabem disso e se aproveitam dessa situação para também “brincar de faz de conta” e ampliar o tamanho da desgraça em interesse próprio. Temos que estabelecer políticos sérios, eleitos por eleitores sérios, para que possamos ter políticas públicas sérias.
Por favor, leia o artigo que coloquei no site ontem, pois falo um pouco mais dessa questão.
Mais, uma vez, muito obrigado e um grande abraço.
Prof. Luiz Eduardo