Resumo: Mais uma vez, estou aqui para lembrar que não adianta ter um “Dia Mundial da Água”, se continuamos cuidando mal desse recurso vital. Precisamos compreender que sem água não existe vida e que somos os responsáveis pela manutenção da quantidade e da qualidade da água no planeta. Temos que trabalhar seriamente nesse compromisso.
Estamos no mês de março, o mês internacionalmente dedicado a água, desde 1993. A data foi recomendada durante uma reunião ocorrida na Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CONUMAD), conferência que ficou conhecida como Rio 92 ou Eco 92 e que aconteceu em junho de 1992 na cidade do Rio de Janeiro. A data foi efetivamente assumida pela ONU, em 21 de fevereiro de 1993. Assim, essa data começou a ser oficial em 22 de março no ano de 1993. Portanto, neste mês estamos oficialmente completando 30 anos de Dia Mundial da Água. Antes de qualquer coisa quero fazer um pequeno comentário sobre a água, que embora eu acredite que todos saibam, parece que quase ninguém se lembra.
É engraçado, que a água, sendo a substância que compõe o meio congênito que foi capaz de produzir a vida no planeta, tenha sido relevada a condição vulgar de mais uma mera substância química pela humanidade. Todos sabem que, se não existisse água não existiria a vida, pelo menos, a vida como conhecemos e entendemos aqui na Terra. Pois então, essa mesma água que está no planeta desde os primórdios da Terra, há mais de 5 bilhões de anos, só teve sua importância decretada internacionalmente há apenas 30 anos. Essa é uma daquelas questões de valores que a gente não entende e que deveria ser extremamente trágica, se não fosse tristemente cômica.
Vou falar um pouco de água, mas não vou fazer um artigo técnico ou coisa parecida. Também não vou me referir aos usos múltiplos da água e suas diferentes aplicações para a humanidade. Não vou fazer nada disso. Vou somente mencionar a água como água em seu valor absoluto, qual seja, uma substância fundamental para a formação e a continuidade de TODA a vida no planeta Terra, mais particularmente a vida humana.
A água é a substância mais abundante e uma das substâncias mais importantes do planeta, por ter sido o ambiente básico que propiciou a formação e por manter toda a vida no planeta. A repetição é proposital, para ver se as pessoas se tocam, passem a entender, se acostumem efetivamente com essa ideia e vislumbrem a verdadeira importância da água.
Como a água, que é disputada até belicamente em algumas regiões do mundo, necessitou levar tanto tempo para ser considerada como uma substância importante? Como a água foi, ao longo da história, tão desprezada e tão pouco valorizada pelo ser humano? Por que ainda tem tanta gente que não dá o devido valor a água? É muito difícil entender e responder a essas perguntas.
Além disso, ainda cabe lembrar, que a espécie humana é apenas mais uma das milhões de espécies de organismos vivos que são totalmente dependente da água existente no planeta. Mas, também é necessário ressaltar que a espécie humana é aquela mesma que se autointitula como a única racional e, por isso mesmo, se acha superior as demais. E, o pior ainda é que, para muitos, a espécie humana foi feita à imagem de Deus e por isso mesmo, deve ser a “dona absoluta” de todas as coisas existentes no planeta e deve se utilizar de tudo na Terra a seu bel prazer, inclusive e principalmente da própria água. Bem, chega de ficar citando esses absurdos que infelizmente muita gente acredita e defende e vamos em frente.
Historicamente, no mundo todo, a água sempre foi tratada como mais uma “coisa qualquer” que existe no planeta para o ser humano usar, esbanjar e poluir, ainda que tanto seu excesso, como sua carência, possam ser causas de terríveis catástrofes, de inúmeras mortes e muitas guerras em vários momentos e situações da História. Aliás, é bom lembrar que até hoje, ainda existem centenas de conflitos por conta da posse e do uso da água. Esses conflitos vão desde simples discussões locais, ou pendengas regionais, ou ainda embates interestaduais em diversos países e até mesmo guerras internacionais pelo planeta afora.
Pois é, meus amigos, a água é uma só, mas a distribuição da água planetária é desigual e enquanto uns esbanjam e jogam água fora outros carecem e até morrem de sede. Enquanto secas castigam parte da humanidade, enchentes também castigam outras partes. Enquanto alguns sujam a água, outros precisam utilizar essa mesma água imunda para continuar vivendo. Cabe lembrar que a água também é a fonte de transmissão da maioria das doenças conhecidas. E estranhamente, nós, os seres humanos “superiores”, passamos toda nossa curta história, sem reconhecer a devida importância à água.
Bem, de qualquer maneira, embora tarde, depois de 15 mil anos de história, parece que o homem moderno está começando a compreender que água não é apenas uma substância importante. A Água é preponderante, água é fundamental. Assim, a Organização das Nações Unidas resolveu atribuir uma data mundial para a água. Como diz o ditado, antes tarde do que nunca. Mas, é daí? O que temos feito nesses 30 anos?
Depois que a ONU descobriu a água, certamente mais gente descobriu ou foi induzido a descobrir e algumas coisas começaram a acontecer no planeta visando a proteção desse líquido precioso. Parte da humanidade procurou poluir menos, usar melhor, não desperdiçar, recuperar e proteger os mananciais e, sobretudo, não criar dependências hídricas e reutilizar a água o mais possível, mormente na área industrial. Essas ações têm efetivamente crescido pelo mundo afora, porém a população humana aumenta rápida e progressivamente e as necessidades hídricas também. Desta maneira temos conseguido pouca melhora e ainda estamos muito longe da condição ideal no trato cotidiano e necessário com a água.
Os países desenvolvidos, principalmente os europeus, têm relativamente minimizado seus problemas e aproveitado o pouco de água que lhes restaram. Os países da América do Norte e Central ainda têm suficiente quantidade de água e seguem com rigor as normas de uso e saneamento dos recursos hídricos. Na Ásia, a exceção da China, a maioria vai de mal a pior, pois a poluição hídrica é terrível. Mesmo na China, que tem muita água, a maior parte dessa água está comprometida e poluída. Os países da África sofrem muito com as secas prolongadas em várias regiões e os países do Oriente Médio não têm praticamente nenhuma água.
Na Austrália a carência é grande, mas lá também existe bastante responsabilidade com a água. Aqui, na América do Sul, quantitativamente a coisa ainda vai relativamente bem. No Brasil, não deveríamos ter problemas, pois possuímos a maior quantidade de água no estado líquido do planeta, porém, historicamente, cuidamos mal de nosso patrimônio hídrico e assim, qualitativamente, também temos muitos problemas, com poluição orgânica, devido à falta saneamento e com desperdício exagerado.
Em suma, o mundo descobriu que a água é fundamental, mas ainda precisa acreditar nesse fato e agir de acordo e com às condições ambientais de cada região, respeitando as necessidades e procurando garantir os recursos hídricos para todos. Isto é, garantir água para as gerações atuais e principalmente as gerações futuras, porque se não nos dispusermos a garantir água hoje, certamente irá faltar água amanhã.
Cabe relembrar que, sem água não há vida. O ser humano “racional e superior” precisa justificar esse insigne rótulo, que ele mesmo se deu, e usar os recursos hídricos com sabedoria. Se isso não acontecer, mesmo com a ONU decretando “O Dia Mundial da Água”, algumas regiões do planeta continuarão à mercê de possíveis carências e mesmo ausências da água. Se isso acontecer mais significativamente teremos agravado o quadro de perda de vidas humanas por conta de falta de água e isso certamente é algo desinteressante para a Humanidade e mais ainda para o planeta.
No nível tecnológico em que o mundo se encontra hoje, onde o ser humano é capaz de realizar quase tudo, certamente temos que ser capazes de garantir água em quantidade e qualidade para toda a Humanidade. Assim, perder vidas humanas por questões hídricas é mais que um absurdo e deveria ser considerado um “crime de descaso”. Não podemos deixar essa situação crescer ainda mais. Já sabemos, como, onde e o que fazer para resolver os possíveis problemas, precisamos apenas cumprir com as nossas obrigações humanitárias.
Temos que entender definitivamente que TUDO AQUI NO PLANETA TERRA É LIMITADO, inclusive o próprio planeta, e temos que trabalhar para que, mesmo sabendo das limitações, tudo possa ser perpetualizado o mais possível. Isto é, a luta maior da humanidade é tentar manter e ampliar cada vez mais o tempo de vida de todas as coisas, porque assim também ampliaremos as possibilidades de manutenção da vida orgânica, inclusive e principalmente, da vida humana.
No que tange aos recursos hídricos, o ser humano é tão ou mais frágil, que qualquer outro organismo vivo do planeta, porque a nossa dependência imediata da água é proporcional e significativamente maior que a dos outros organismos planetários. Além disso, sempre é bom ressaltar que nós, talvez, sejamos os únicos organismos que temos a exata dimensão dessa nossa dependência hídrica e isso nos impõe uma responsabilidade maior em relação à água.
Meus amigos, faz 30 anos que começamos a pensar mais sério sobre a água, entretanto ainda estamos trabalhando pouco nesse assunto vital. Doravante, temos que efetivamente agir muito mais sério, para garantir água para todos e para sempre. O cuidado com a água tem que ser eterno. Criamos um “Dia Mundial da Água”, mas precisamos entender e assumir que precisaremos de água todos os dias.
Luiz Eduardo Corrêa Lima (67) é Biólogo (Professor e Pesquisador), Escritor, Revisor e Ambientalista; Membro Titular do Comitê das Bacias Hidrográficas do Rio Paraíba do Sul – CBH-PS e Presidente da Comissão de Meio Ambiente do Distrito 4.571 de Rotary International