Resumo: Nesse texto coloco minha impressão do atual estado de degradação da sociedade, em consequência da inversão de valores e da falta de generalizada de consideração do ser humano pelo próprio ser humano. Acredito que esse seja realmente o maior problema da humanidade na atualidade e sugiro que este deve ser o caminho para iniciar a recuperação da sociedade.
Muita gente costuma afirmar que: “o mal não existe: o mal é uma criação do homem”. Em certo sentido, por mais que muitos não queiram admitir, se acaba mesmo tendo que aceitar essa afirmação como verdadeira e considerando que a maldade é uma questão específica humana. Até porque, embora se observe muita agressividade na natureza, não se vê nenhuma maneira estrita de maldade nas demais espécies vivas do planeta, principalmente no que diz respeito aos seus respectivos semelhantes.
Por outro lado, pelo que tem sido possível observar ultimamente, está parecendo que o mal humano está progressivamente maior, pois a humanidade aparenta estar em guerra contra si e contra o planeta e assim, a maldade tem se demonstrado como uma característica cada vez mais comum da nossa espécie. Mas, será que isso é mesmo uma verdade? Somos, de fato, uma espécie má ou apenas está faltando um pouco mais de coerência, de amor, de respeito e comiseração no tratamento com os nossos semelhantes?
Atualmente as pessoas não querem saber quem são as outras: “todo mundo está aqui, mas parece que não está, quase ninguém se mostra abertamente à sociedade, isto é, ninguém é, nem quer ser coisa alguma num contexto maior, simplesmente para não ter que se explicar e nem ter que se comprometer”. Sendo assim, como ninguém quer se mostrar, acaba sendo melhor também que as pessoas não procurem saber muito sobre as outras. Quer dizer, a coisa é mais ou menos assim: “eu não falo de mim; você não fala de você e assim a gente não se conhece, não se envolve e realmente não se responsabiliza”. “Eu vivo minha vida, você vive a sua e nós seguimos em frente, sem olhar para os lados”. Em outras palavras: o desleixo e o descaso tomaram conta da sociedade, que se despreza e se individualiza cada vez mais.
Por conta disso, hoje, na grande maioria dos grupos sociais, ninguém sabe quem é quem e deste modo apenas se vive de olho no próprio umbigo e não se convive de fato com quem está à volta. Por mais interessante, destacado e até mesmo importante que alguém possa ser num determinado grupo, na maioria das vezes ninguém olha, nem repara, e muito menos se preocupa com esse sujeito. A verdade é que cada indivíduo humano se fechou no seu mundo, olhando apenas para o seu umbigo e ninguém quer saber de nada mais, mormente, do umbigo do outro.
Ora, como é possível conhecer o mundo sem conhecer as pessoas, os demais seres humanos semelhantes a nós, que estão no mundo ou, pelo menos, a nossa volta, no nosso grupo social? Como é possível fazer parte verdadeiramente de um grupo social, se não se procura ter conhecimento real e efetivo das demais pessoas que compõem esse grupo? Pois então, esse é o grande problema, que gera toda a crise e toda aparente e progressiva maldade dos seres humanos.
Todo mundo faz, fala, causa e acontece, independentemente de quem esteja do outro lado, porém ninguém ouve, atende, participa, compartilha com quem está do outro lado. Para a grande maioria dos humanos, as outras pessoas simplesmente inexistem. O outro, aquele que está do nosso lado, tem sido sempre o que menos importa no atual convívio social da humanidade De uma maneira geral, o ser humano está cada vez mais arrogante e menos humilde no relacionamento com seu semelhante. O egoísmo tem sido a marca maior do nosso tempo e tudo se resolve na primeira pessoa do singular, eu. Enquanto essa situação não mudar, será bastante difícil, talvez seja mesmo impossível, modificar o mundo humano e suas terríveis e crescentes tendências à maldade.
As coisas boas que todos dizem querer e o bem maior da sociedade humana, dependem da ação de todos e por isso todos necessitam se conhecer e participar, ou melhor, efetivamente conviver. Cabe lembrar que conviver quer dizer viver junto e viver junto é muito mais do que apenas morar ou habitar junto. Viver junto envolve compromisso de vida junto, ou seja, ser junto e não apenas de estar junto. Conviver é se envolver e compartilhar sentimentos, momentos e atitudes juntamente.
Para conviver tem que conhecer. Pense bem e responda: qual foi a última vez que você pensou em apenas ligar para o seu “amigo”, só para saber como ele está ou o que está fazendo? Para saber como está a saúde daquele filho dele que estava adoentado? Para oferecer uma ajuda voluntária naquele projeto que ele pretendia desenvolver? Pois então, assim é que efetivamente se convive.
Infelizmente, a situação costuma ser assim: o indivíduo que manda sempre um “Bom dia” pela rede social é o mesmo que não cumprimenta seu subalterno, quando chega no seu local de trabalho e finge que não vê aquele vizinho, quando cruza com ele na rua. Ora, alguma coisa está errada com esse tipo de indivíduo, mas é exatamente isso que traz a maldade, porque o outro se sente ofendido e acaba contra atacando. Deste modo, duas pessoas se tornam inimigas, sem nem se conhecerem direito, apenas por mágoa, por precaução ou por se auto defender daquilo que ela pensa que a outra pode fazer. Meus amigos, infelizmente essa é a verdadeira raiz do problema: “está faltando humanidade aos seres humanos”.
Faz muito tempo que já viramos máquinas e só pensamos em ter e poder. Não importa o outro, independentemente de quem seja esse outro, desde que eu possa mais ou que eu tenha alguma vantagem. Não há tempo e nem há direito para quem é diferente daquilo que a minha vontade quer. Quando será que os preocupados em ter entenderão que antes de ter é preciso ser, no nosso caso, ser humano? Quando será que os preocupados em poder entenderão que só existe poder com dominação e se eu posso, alguém necessariamente deixa de poder? Se há quem tem e pode, os “poderosos”, certamente há quem não tem e não pode, os “dominados”. Os poderosos se esquecem costumeiramente, que eles vivem na dependência direta dos dominados e isso gera repulsa e ódio.
Por outro lado, se os dominados, de repente, resolverem cruzar os braços, o que será dos poderosos? Isso também gera repulsa é ódio. O embate se faz e a maldade cresce a partir dessa competição medíocre que existe entre dois seres semelhantes, que deixam de ser humanos, pois não se toleram, exatamente porque inverteram as prioridades e a noção de viver bem.
É claro que essa competição pode produzir muita dor, principalmente para o lado mais fraco, os dominados, mas certamente, se houver interesse, também poderá trazer muito valor a ser descoberto por parte dos poderosos e egoístas. Pois então, é exatamente isso que está faltando ao mundo, principalmente aos pretensamente poderosos, o valor. Não me refiro ao valor monetário, mais o valor verdadeiro, o valor que realmente é e não o valor que apenas vale.
Estou falando daquele valor que envolve a ética, o direito, a justiça, a igualdade, a decência, o respeito, a moral e sobretudo o altruísmo e a identidade humana. Todos esses adjetivos que mostram que o outro é tão humano, quanto aquele que tem recursos e poder. Esse outro humano, que não tem recursos e poder, também precisa de espaço para sobreviver e principalmente para viver na sociedade, com todos os direitos e deveres que ela possibilitar. A humanidade precisa compreender que o bem maior da sociedade é consequência da prática cotidiana dos bons valores.
Pois então, se o ser humano efetivamente passar sempre a tratar o outro ser humano como, de fato, todos os seres humanos querem e devem ser tratados, tenham certeza que tudo começará a mudar nas relações humanas e a maldade humana passará a ser progressivamente menor. Desta maneira, nós deixaremos de dar efetiva razão a máxima que iniciou esse texto e provaremos que certamente, o mal é indiferente e pode até existir, mas a maldade obviamente não é uma criação humana arbitrária e naturalmente condicionada à nossa espécie, como muitos dizem ser.
A maldade é apenas e tão somente o resultado trágico de uma confusão de ações, oriundas de interesses individuais, criadas pela humanidade, em consequência dos desajustes sociais produzidos, por conta da inversão de valores ao longo da história humana. Sendo assim, a maldade humana não é uma condição definitiva. Ao contrário disso, a maldade humana é uma situação temporária que pode e deve ser modificada no interesse precípuo da própria humanidade.
No dia em que a humanidade compreender claramente esse fato e se propuser a trabalhar ativamente contra essa condição desagradável e degradante da sociedade, a partir desse exato momento, finalmente, nós estaremos começando a extinguir a maldade e nos tornando verdadeiramente seres humanos. Nossa condição de seres humanos melhores ou piores, depende exclusivamente de nós mesmos.
Luiz Eduardo Corrêa Lima