Tag: Sociedade

05 jan 2019

Sobre a ocorrência de “cópula” entre indivíduos do sexo masculino em determinadas espécies animais

Resumo: O texto reúne as ideias que confrontam os interesses midiáticos e o conhecimento científico sobre a questão relacionadas as possíveis atividades sexuais entre os animais do mesmo sexo. Essa é uma questão bem polêmica, mas que precisa ser discutida mais tecnicamente, até porque muito tem sido falado pela mídia e por outros interessados, porém os assuntos são fornecidas à sociedade sem nenhuma base científica.


Sobre a ocorrência de “cópula” entre indivíduos do sexo masculino em determinadas espécies animais

Ultimamente tem sido muito comum surgirem artigos tentando demonstrar a existência de homossexualidade em animais e mais ainda, tentando relacionar esse pretensa existência com a homossexualidade humana. Devo dizer, de imediato, que tudo isso não passa de uma grande confusão que estão fazendo, alguns por desconhecimento e ao que parece, outros apenas para tentar criar problemas onde eles não existem e assim tentar justificar o injustificável a partir de exemplos da natureza, ou ainda para buscar o amparo natural para explicar determinadas situações sociológicas conflitantes e questionáveis de certos comportamentos humanos.
Na verdade é extremamente comum a ocorrência e consequentemente a observação de uma aparente cópula ou coito (talvez fosse melhor chamar de pseudocópula), entre machos de várias espécies de animais, nos mais diversos grupos zoológicos, mormente entre os mamíferos e os insetos. Entretanto, essa situação não condiz, de maneira nenhuma e nem se  aproxima biologicamente, com uma verdadeira cópula por vários aspectos, os quais tentarei demonstrar nesse breve texto.
Primeiramente deve ficar claro que muitas vezes não existe penetração e mesmo quando até ocasionalmente existe, ninguém pode efetivamente afirmar que essa condição tenha algo a ver com sexo ou com sexualidade, até porque o sexo na natureza e nos animais especificamente tem função única e exclusivamente reprodutiva. Num segundo momento é preciso
ficar claro definitivamente também, que existem situações comportamentais em algumas espécies, nas quais acontece de um indivíduo simplesmente trepar sobre outro, mas isso não se caracteriza como uma atividade sexual. Na verdade, essa situação costuma ser considerada como uma indicação de sua superioridade ou mesmo de inferioridade perante o outro e obviamente, isso também não tem nada a ver com sexo.
Existe ainda uma terceira situação que pode ocorrer em algumas espécies, relacionada ao transtorno produzido pelo excesso de hormônio sexual nas épocas reprodutivas, o que leva o indivíduo em questão a querer ter uma relação, a fim de se livrar do transtorno produzido pelos hormônios sexuais. Nesse caso chega mesmo a ocorrer uma “cópula”. Entretanto, em nenhuma dessas situações parece existir afinidade e nem interesse entre um macho e outro da mesma espécie na natureza e muito menos, qualquer situação relacionada ao prazer sexual efetivo ou ao mero hedonismo individual de certos humanos. Na verdade são situações comportamentais e
fisiológicas momentâneas e não condições perenes assumidas pelos indivíduos.
Quer dizer, de qualquer maneira, nenhuma dessas situações de “coito ou cópula” pode ser considerada como uma condição homossexual efetiva no animal que momentaneamente as apresenta, como pretendem alguns indivíduos. Aliás, é bom que se repita e se esclareça, que todas essas situações citadas são momentâneas. Isto é, nenhum animal não assume essa pretensa condição homossexual por toda a sua vida. Mesmo alguns Anfíbios Anuros (sapos da família dos Bufonídeos) que podem efetivamente trocar de sexo, pois nascem machos e posteriormente viram fêmeas, não podem ser considerados como homossexuais, porque eles passam a agir efetiva e
fisiologicamente como fêmeas. Isto é, eles tornam-se fêmeas real e funcionalmente.
Obviamente que esses animais não fazem isso deliberadamente, ao contrário essa é uma necessidade imposta em certas situações para dimensionar a paridade dos sexos entre os indivíduos das populações locais dos animais. Essa é uma condição populacional imposta naturalmente, que é controlada genética, fisiológica e ecologicamente que efetivamente existe em algumas espécies de Anuros.
Existem vários outros casos de hermafroditismo (presença dos dois genitais num único indivíduo) animal, onde a atividade funcional do sistema genital varia, como acontece em alguns Gastrópodes Pulmonados (caracóis terrestres), mas não vou discutir sobre isso no momento, porque vai fugir ao propósito desse ensaio. Situações de hermafroditismo são comuns no Reino Animal, mas elas não têm nada a ver com homossexualismo, porque não existem indivíduos machos ou fêmeas, haja vista que todos indivíduos possuem os dois genitais e, dependendo da espécie, pode ocorrer uma autofecundação ou então uma fecundação cruzada.
Os animais só fazem sexo porque isso é uma necessidade da espécie. Isto é, da mesma maneira que se alimentam, que dormem, que respiram, que migram, enfim que sobrevivem e por isso mesmo, eles não têm tempo para brincar com sexo, como muitos humanos costumam fazer. Em suma, o sexo entre os animais é coisa séria e não pode ser comparado com qualquer
manifestação sexual humana, até porque os humanos, além da efetiva prática consciente da manifestação homossexual, extrapolaram e transcenderam bastante a verdadeira questão sexual como maneira prioritariamente reprodutiva.
Falar de homossexualidade em animais, exige, antes de qualquer coisa, que, além da sodomia (“sexo anal”), se pense também em felação (“sexo oral”) e ainda em inúmeras formas de masturbação, atividades tipicamente humanas e que lógica e indiscutivelmente não têm como existir nas diferentes espécies animais. Assim, não pode haver homossexualismo real e efetivo, embora até possam ocorrer coitos ou cópulas (pseudocópula) fortuitas entre alguns indivíduos machos de uma mesma espécie, como já foi dito.
Cabe lembrar ainda que o ato sexual (coito ou cópula) entre humanos do mesmo sexo, em certo sentido, nem sempre pode ser considerado como uma atividade realmente sexual, exatamente porque essa ação supera a necessidade reprodutiva e implica em outras necessidades, ligadas ao hedonismo, que nada têm a ver com o sexo propriamente dito. Se me permitem, eu posso até afirmar que, por exemplo, a cópula ou coito com o uso de preservativos é uma atividade ligada ao sexo, mas não é sexo verdadeiro, porque visa exatamente impedir a função primária do sexo que é a reprodução.
Assim, mecanismos anticoncepcionais, na verdade são atividades antissexuais, ao menos nas suas origens (intenções), porque objetivam prazer (hedonismo), mas não reprodução e assim não se constituem em sexo verdadeiro. Na realidade o sexo com qualquer tipo de preservativo parece mais com uma maneira sofisticada de masturbação, pois pode satisfazer aos indivíduos envolvidos, mas não se traduz definitivamente em reprodução no sentido efetivo da palavra. Eu sei que essa afirmação é muito discutível, difícil de ser entendida e muito mais difícil ainda de ser aceita, mas é perfeitamente possível se pensar assim.
Outra coisa que precisa ser dita é que em todos os animais mamíferos, exceto nos seres humanos, as fêmeas têm o seu período sexualmente ativo, denominado de estro ou cio, em tempo definido e relativamente bastante curto, durante determinadas etapas de suas vidas. Fora desse período é como se o sexo não existisse para os indivíduos e na verdade ele não existe mesmo, pois não interfere em nada na vida dos animais fora do período do cio. Apenas as fêmeas dos seres humanos não apresentam esse período específico e assim, elas estão susceptíveis ao sexo durante o ano todo, em grande parte de suas vidas.
Acredito que a existência do cio nas outras fêmeas de mamíferos seja também para que o sexo não “suba à cabeça”, como acontece com muitas fêmeas de humanos, haja vista que para essas demais fêmeas de mamíferos existem outras necessidades vitais, que são cotidianas e mais importantes ou pelo menos mais prementes que o sexo. Aliás, cabe dizer aqui também, que o ato sexual é desagradável e dolorido para a grande maioria (senão todas) as fêmeas de mamíferos. Para as fêmeas de mamíferos o sexo é uma obrigação incomoda e que só será possível se todas as outras atividades vitais estiverem sendo satisfeitas a contento.
Em suma, antes de qualquer animal se preocupar com a reprodução é necessário que se esteja vivo. Assim, viver é o mais importante, ainda que a reprodução e o ciclo de vida sejam necessários eles não são vitais para o indivíduo. A reprodução é necessária à espécie, mas o indivíduo precisa estar vivo para concorrer à atividade reprodutiva e por vários fatores, nem
sempre é possível reproduzir, mas sempre é importante manter-se vivo, até mesmo para reproduzir, se este for o caso.
O fundamental, o preponderante é estar vivo e assim tudo é feito para permanecer vivo. Reproduzir é importante, mas definitivamente não é essencial a nenhum indivíduo animal. Nenhum animal do sexo masculino “comete loucuras” pelo desejo do sexo e muito menos vai ter uma relação com outro indivíduo macho, se não conseguir encontrar uma fêmea reproduzir, apenas porque se interessa por outro macho, ou porque tem que copular ou para satisfazer sua necessidade hedonista. Ora, pensar isso é um absurdo e certamente tal fato não tem nenhum cabimento fisiológico e não ocorre na natureza.
Obviamente, a princípio, todos os indivíduos terão o direito de tentar reproduzir, mas precisam estar em condições físicas para isso e deste modo, na época certa, no cio, eles deverão estar saudáveis, bem alimentados e muitas vezes têm que passar por uma competição com outros indivíduos para provar ser o indivíduo que deverá reproduzir com aquela fêmea especial da sua espécie e que deverá ser a mãe de seus futuros filhos que darão continuidade a espécie em questão. Qualquer coisa diferente disso é idiotice ou balela, ou ainda um grande delírio de quem se dá o direito de pensar diferente disso.
Meus amigos, a verdade é a seguinte, as atividades antrópicas relacionadas ao sexo, não podem, de maneira nenhuma, ser comparadas com as atividades sexuais efetivas dos animais. Sexo sem objetividade sexual (reprodutiva) efetiva, ou seja, sexo sem meta de procriação não é sexo. Quando muito, será apenas prazer e os animais “sabem” disso, não têm tempo e nem condições para perder nesse aspecto. A vida animal é uma “guerra” constante entre comer ou ser comido e não há como brincar de sexualidade com um indivíduo do mesmo sexo.
Os animais precisam viver, pois a vida que é o mais importante, sempre é muito complicada e extremamente curta aos interesses de quem está vivo. Assim, meus amigos, para o indivíduo de qualquer espécie animal continuar vivendo é o que consiste no mais importante de suas vidas. Obviamente, se for possível, quem sabe, ele pode reproduzir e trabalhar para dar continuidade à espécie, tentando gerar indivíduos fortes, cada vez melhores e mais bem adaptados. Isso até pode ser um bom negócio, mas certamente não é algo vital.
Apenas o Homo sapiens, atualmente com seus 75 anos em média de muita inutilidade temporal e mental, tem muito tempo para perder em pensar e fingir o sexo verdadeiro para satisfazer o seu prazer individual. Como eu disse antes, pensando naturalisticamente, qualquer atividade sexual que não vise a reprodução em si, acaba sendo uma forma diferenciada de masturbação, o que até pode satisfazer bastante ao corpo, mas que não produz nenhuma efeito reprodutivo real. Nos animais não existe nenhuma possibilidade de que isso aconteça, porque a vida do animal é uma luta interminável por permanecer vivo. Até mesmo para reproduzir existe luta e por isso mesmo nem todos os indivíduos conseguem reproduzir. Aliás, alguns estão tão preocupados em se manter vivos, que nem tentam reproduzir.
Espero que fique claro, de uma vez por todas, que copular ou “pseudocopular” não é reproduzir. Aliás, o que os humanos menos querem, quando eles “transam” é reproduzir. Os animais não têm essa dimensão de valor fisicamente e muito menos mentalmente, de copular por copular, sem querer reproduzir. A reprodução para os animais é algo inerente as suas respectivas vontades, a reprodução é algo que acontece, porque tem que acontecer, com um objetivo único, no momento certo, com o indivíduo certo e do sexo oposto. As espécies vivem e buscam continuar existindo através de seus indivíduos que demonstrem maior capacidade reprodutiva e isso está geneticamente condicionado nos indivíduos e em suas respectivas atividades reprodutivas, quando existentes, e não existe outra maneira de ser.
Posso estar enganado, mas entendo que quando alguém aplica o conceitode homossexualidade esse alguém está pensando na afinidade mútua entre indivíduos do mesmo sexo, muitas vezes até rejeitando o outro sexo, pois o indivíduo homossexual se interessa principalmente pelo indivíduo de sexo igual ao seu. Ora, esse tipo de situação simplesmente não existe na natureza animal. Nenhum indivíduo de uma determinada espécie animal deliberadamente fica atraído ou interessado em outro indivíduo de sexo igual ao seu. O sexo biológico é uma condição genética relacionada à vida e à continuidade da espécie e isso só é possível entre indivíduos de sexos diferentes. Por tanto é, no mínimo, um exagero comparar com a
homossexualidade a possível pseudocópula entre animais de uma mesma espécie.
Infelizmente certas buscas de padrões naturais para justificar ou para se tentar fazer entender melhor algumas situações sociológicas humanas acabam produzindo mais problemas e maior confusão. Além de também levar ao mal entendimento e mesmo à conceituações erradas dos fenômenos naturais. Os animais não têm culpa das necessidades humanas e vice- versa. É óbvio que somos biologicamente animais, mas a espécie humana desenvolveu padrões comportamentais exclusivos, os quais estão associados à cultura humana e que por isso mesmo não têm precedentes em toda a classificação zoológica, como vestir, cozinhar, rezar e outros.
Talvez a homossexualidade seja um desses padrões, justificáveis apenas pela cultura humana, pois ainda que alguns seres humanos queiram propositalmente empregar o termo homossexualidade erroneamente para os animais, certamente essa é mais uma das muitas falácias sociais impostas por determinados grupos à sociedade, para galgar outros objetivos. Eu só lamento que nesse caso, os bodes expiatórios que justificam essa ação infundada sejam os animais.
Repito mais uma vez: na natureza, em particular no Reino Animal, só existe atividade sexual com fins exclusivos de reprodução. Qualquer outra situação de coito, cópula ou pseudocópula não pode ser confundida e muito menos traduzida ou comparada com qualquer atividade existente na sexualidade humana, porque isso é, no mínimo, um abuso do direito e uma falta de respeito dos seres humanos com os animais.
É incrível, mas exatamente quando finalmente a sociedade humana parece estar conseguindo atingir um nível de percepção maior sobre a sua própria natureza animal, no qual os animais estão, cada vez mais, deixando de ser cobaias físicas, haja vista que cada vez menos se utiliza os animais em pesquisas laboratoriais, começam a acontecer essas situações absurdas. Pois é, exatamente nesse momento, que surge agora um novo modelo de cobaia para utilização dos animais. Agora os animais passam, lamentável e tristemente, a ser cobaias psicológicas ou virtuais, apenas para satisfazer o ego de alguns seres humanos. Estou aqui fazendo a minha parte para que
essa idiotice não prospere e não se propague.
Por fim, quero deixar claro a todos os leitores, que não tenho nada contra o interesse e muito menos a opção sexual de quem quer que seja, ao contrário, penso que cada ser humano é proprietário de sua mente, tem seu livre arbítrio e que pode e deve fazer o que quiser com seu corpo e principalmente com sua sexualidade, mas tenho vergonha de pessoas que se escondem atrás dos animais para tentar justificar suas dúvidas ou seu conflitos pessoais e assim minimizarem seus possíveis erros.
A homossexualidade, boa ou ruim, certa ou errada, moral ou imoral, até que provem o contrário, é uma característica exclusiva da espécie humana, essa é a realidade nua e crua, doa a quem doer. Não se trata aqui de defender a situação ou condição A ou B, na verdade o que se quer é apenas e tão somente defender os coitados dos animais das possíveis agressões físicas e éticas que lhes são arbitrariamente incutidas por pessoas que não têm absolutamente nenhum conhecimento biológico básico e muito menos conhecimento de etologia especificamente.
Para terminar, eu quero ainda dizer que não há prazer nenhum no sexo animal, o que existe é uma obrigação biológica, de causa genética e fisiológica das espécies animais na busca da continuidade da vida. Por conta disso, ao contrário do que muitos humanos pensam ou querem acreditar, para muitas espécies animais, particularmente para as fêmeas dessas espécies, o sexo algo muito ruim, dolorido e desagradável, mas que é necessário e que alguém (alguns indivíduos) precisam fazer, pois tem que acontecer para as espécies continuarem existindo.
Mas, se não fosse assim e se existisse outra alternativa, isto é, se o sexo não fosse uma questão de sobrevivência das espécies, provavelmente vários indivíduos animais de muitas espécies certamente prefeririam não ter que fazer relações sexuais. As fêmeas não sentiriam o incomodo do cio, não teriam que suportar o peso e a violência dos machos e muito menos a amamentação (no caso dos mamíferos), a criação e a orientação dos filhos. Os machos, por sua vez, não teriam que se desgastar fisicamente e nem travar batalhas violentas com seus pares e também não correriam o risco de se mutilarem. Além disso, todos poderiam dispor e utilizar o curto tempo de suas vidas em interesses particulares mais interessantes, como, por exemplo, se alimentarem quantitativamente mais e qualitativamente melhor.
Além disso é fundamental entender que, se o sexo com uma fêmea da sua espécie não é nenhuma maravilha para os indivíduos envolvidos e só acontece porque é obrigatório, me parece óbvio que o sexo com outro macho então deve ser bem pior. Desta maneira não dá para defender, de jeito nenhum essa lamentável e triste corrente que especulativamente vem tentando admitir a existência de uma homossexualidade deliberada entre certas espécies de animais.
Sinto muita tristeza e vergonha desse pretenso envolvimento dos animais para buscar justificativas de questões que são estritamente antrópicas e fico mais entristecido ainda, quando vejo alguns homens ligados às ciências naturais reforçando essas ideias absurdas e descabidas. As ciências naturais e a Biologia em especial, não deveriam ser lugares para esse tipo de sujeito que apoia, promove e proclama crendices em nome da ciência.

Luiz Eduardo Corrêa Lima (62)
Biólogo (Zoólogo), Professor, Pesquisador, Escritor e Ambientalista;
Presidente da Academia Caçapavense de Letras (ACL).

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14 abr 2015

Refletindo sobre alguns valores esquecidos pela vida moderna

Resumo: O texto dessa semana traz à baila uma questão séria, que está cada vez mais preocupando algumas pessoas e que precisa ser mais discutida e refletida pela sociedade. Trata-se do uso exagerado das novas tecnologias e do consequente afastamento entre as pessoas que esse uso tem trazido. Com o uso desregrado das tecnologias e com os superpoderes a elas concedidos, a humanidade parece estar perdendo sua relação direta com os ambientes primários da natureza e com os demais seres vivos, inclusive com os próprios seres humanos, o que tem trazido consequências progressivamente mais trágicas para a natureza e mais desagradáveis ao relacionamento humano.


Refletindo sobre alguns valores esquecidos pela vida moderna

Ultimamente tenho me preocupado muito com o rumo dos relacionamentos entre os seres humanos e ainda que eu não possa taxativamente afirmar que a fragilidade desses relacionamentos seja uma verdade mundial, eu tenho quase certeza que os relacionamentos humanos atuais pelo mundo afora são meras externalidades. Com certeza, essa é uma verdade brasileira, porque aqui em nosso país, as pessoas efetivamente, têm progressivamente caminhado para trás, no que diz respeito aos relacionamentos humanos e também às coisas da natureza, das tradições, dos valores culturais e morais em geral.

Também não sei se posso e nem quero considerar como uma verdade absoluta de que a causa dessa condição seja exclusivamente da tecnologia, mas infelizmente, tenho que considerar o fato de que o avanço tecnológico tem ajudado bastante no atual estado da arte e no momento, vou me ater exatamente ao seguinte questionamento: porque a tecnologia parece estar nos arrastando cada vez mais para longe das coisas e dos valores que nos deveriam ser mais importantes?

A propósito, devo dizer que não tenho absolutamente nada contra o avanço tecnológico e nem mesmo sou avesso aos novíssimos e diversificados aparelhos eletrônicos. Ao contrário acho todos eles ferramentas importantíssimas e que bom que nós conseguimos desenvolvê-los para facilitar muitas das diferentes tarefas que temos que resolver. O problema é que muitos de nós somos incapazes de entender que esses aparelhos são apenas e tão somente ferramentas. Esses aparelhos não são e nem podem ser considerados, de maneira nenhuma, como se fossem elementos vitais, que precisamos para continuar vivos, como o ar ou a água, pois já vivíamos anteriormente independentemente da existência deles. Como disse antes, esses aparelhos são úteis, mas certamente não são fundamentais. Obviamente existem alguns casos em que peças tecnológicas foram desenvolvidas exatamente para auxiliar a vida de algumas pessoas, mas essas são situações excepcionais e não regras.

A tecnologia está aí para tentar nos fazer mais capazes, mais eficientes e consequentemente mais felizes e tudo isso é obviamente muito bom num primeiro momento. Entretanto, será que essa felicidade inicialmente prevista tem sido secundariamente uma verdade em si, quando o avanço tecnológico nos leva a esquecer, ou pelo menos, nos afastar de outras coisas que, na nossa condição de seres vivos e principalmente de indivíduos humanos, talvez nos fossem muito mais importantes? Será que o nosso apoderamento tecnológico não nos coloca frente à questões que, talvez, possam estar nos trazendo mais prejuízos do que benefícios, apesar de nos permitir soluções aparentemente mais efetivas? A eficiência tecnológica nem sempre tem se mostrado eficaz sob vários aspectos, principalmente nas questões socioambientais. Bem, vou exemplificar meus questionamentos para tentar ser um pouco mais claro.

Imagine que quando não tínhamos agendas eletrônicas ou objetos semelhantes (alguns de nós nem conseguem imaginar isso), éramos obrigados a guardar os números de telefone, anotando ou mesmo decorando esses números e isso era bom para nós, porque nos forçava a escrever e pensar. E mais, quando íamos ligar para aquele número, necessariamente tínhamos que discar ou digitar, o que nos obrigava também a realizar um exercício físico, ainda que pequeno. Quando queríamos falar com uma pessoa e não podíamos ir à casa dela, nós telefonávamos e conversávamos com essa pessoa. Muitos de nós ficavam horas no telefone, o que era ruim, porque a conta a ser paga era alta. Entretanto, hoje usamos o “Whats App” e não pagamos nada e isso é bom, mas também não conversamos verdadeiramente com ninguém, apenas mandamos mensagens simples, sem qualquer conotação pessoal. Assim, as inter-relações são frias e de pouquíssimo conteúdo. Não escrevemos mais, apenas trocamos recados cheios de frases viciadas, com códigos, abreviaturas e símbolos, muitas vezes insuficientes para definir ou mesmo apenas para indicar uma determinada condição.

Tudo bem, é claro que essas mensagens de internet também são uma forma de linguagem, mas certamente essa não é uma linguagem que sirva para aproximar os seres humanos, porque ela é superficial e não expressa sentimento nenhum. O “internetês” é a comunicação pela comunicação e nada mais que isso e por mais que ele aproxime (facilite) as informações ele afasta as pessoas, que ficam cada vez mais isoladas em seu mundo exclusivo com seu celular, seu “tablet” ou seu computador de última geração. Posso estar errado, mais isso absolutamente não é humano, pelo menos do ponto de vista sensitivo.

Chamamos as redes de “internet” do tipo “facebook” e “linkedin”, por exemplo, de “Redes Sociais”, mas eu pergunto: essas redes são sociais mesmo? Tudo bem, elas envolvem grupos de pessoas da sociedade, mas elas não se comportam como algo que socialize as populações? Não, elas fazem exatamente ao contrário, pois elas excluem pessoas, quando não permitem sua participação em determinados grupos e isso ao meu ver é uma atitude antissocial. Talvez, fosse interessante chamar essas redes de outro nome, porque “Redes Sociais” é que elas não são mesmo. Porém, deixemos essa questão de lado, porque não é disso que quero eu tratar aqui.

Na minha infância, nós convivíamos muito mais com a natureza e com as pessoas do que qualquer criança de hoje em dia, mormente nos últimos anos com o advento da internet. Nós brincávamos de pique, jogávamos futebol, bola de gude, rodávamos pião, soltávamos pipa e várias outras coisas que hoje, tem criança (talvez a maioria delas) que nem sabe do que se tratam essas coisas, simplesmente porque nunca as viram e não têm nenhuma relação com outros humanos, além da internet e das “Redes Sociais”. Quer dizer, quase não há convivência efetiva com outros humanos, a não ser nos meios de transportes, quase sempre particulares e nos ambientes corporativos familiares, escolares, culturais e laborais. Hoje inventamos até “bichinhos virtuais” até para afastar mais as pessoas umas das outras e o que é mais grave, em certo sentido, para afastar as pessoas dos animais também.

Essa situação atual de contraste com que havia em épocas anteriores, pode até ser vantajosa em determinados aspectos, mas certamente é prejudicial em outros tantos. Se for colocado numa balança de custos X benefícios, acredito que certamente há menos vantagens e mais desvantagens no atual modelo, que é resultante do uso inadequado e excessivo da tecnologia.

A meu ver isso tem afastado cada vez mais as pessoas umas das outras e assim também dos valores e das tradições. As diferentes formas de expressões culturais vão ficando esquecidas e a natureza está sempre mais longe e menos importante, pois a vida humana passou a ser quase que exclusivamente urbana e tecnológica. O natural e o rural perderam o sentido e não interessam em praticamente nada na paisagem antrópica atual. Os humanos tendem a viver isolados em seus espaços artificiais.

Esse isolamento, por sua vez, leva cada vez mais ao egoísmo e ao olhar para dentro de si mesmo, o que também aumenta os preconceitos e o medo generalizado das diferenças. O outro humano cada vez importa menos para os humanos. Lamentavelmente, nós temos caminhado no sentido de achar que a felicidade é quase um sinônimo de solidão, porque nos preocupamos apenas conosco e tudo fazemos apenas no nosso interesse individual.

Enfim, reflitam comigo e digam se eu não tenho razão. Penso que está na hora de começarmos a fazer alguma coisa para mudar essa tendência, porque acredito que ela seja muito maléfica aos interesses e valores reais da humanidade. Acredito que nós, os seres humanos, estamos precisando de menos tecnologia e mais humanidade, para podermos engrandecer as nossas vidas, solidificar as nossas sociedades e principalmente estreitar as nossas relações com os demais seres humanos.

Segundo o pensador russo, Lev Semenovitch Vygotsky, nós não nascemos humanos, nós nos tornamos humanos ao longo de nossa vida, pois s nossa humanização é construída progressivamente. Esse mesmo autor vai mais fundo ainda, quando diz que: “o homem só pode se tornar homem na presença de outro homem”, isto é, só nos tornamos homens convivendo com outros homens. Pois então, penso que temos andado na contramão da humanidade e estamos precisando conviver mais com outros humanos para nos humanizarmos mais.

 

Luiz Eduardo Corrêa Lima

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